Sempre gostei de escrever – desde pequena, e as minhas primeiras lembranças de escrita comumente vêm acompanhadas desta imagem:
O braço levantado no meio da sala, a respiração ansiosa, os olhos fixos no professor – eu apenas esperando o momento em que ele me chamasse para ler. Desde aquela época, escrever se associava a falar em voz alta.
Não é, e não era performance. Não era como ser a atriz no palco, uma pianista em uma audição. Em nada se parecia com a bailarina sob o foco de luz branca, ou com som do violino preenchendo o silêncio do auditório. Era e ainda é, como ser o próprio personagem e a música, o rodopio no palco, o arco riscando o instrumento.
Acho que vem dessa época a vontade de escrever; mais ainda de declamar, falar e ler em voz alta.
Escrever para ler em voz alta é uma experiência completa. Corresponde à possibilidade de ser aplaudido, de ver uma lágrima escondida lá longe, de sentir a respiração vacilante de quem está na primeira fila, no suspiro da plateia. Recomendo. Escrever e ler em voz alta é estar consigo mesmo pela segunda vez, emocionar-se de novo, encantar-se, identificar-se, reconhecer-se. Recomendo e recomendo.
Este hábito não saiu de mim e, me recordo, que certa vez, bem mais velha, não conseguir ler um texto meu em voz alta. Emocionada, as palavras enroscavam na garganta. Pedi, então, a uma amiga para fazê-lo por mim. Na hora certa, entretanto, me enchi de coragem e lhe disse que não precisava. Que eu mesma o iria ler.
A coragem é a primeira das qualidades humanas porque garante todas as outras1.
Acho que posso tomar para mim estas palavras de Aristóteles1 pois, com bravura, li meu texto – ainda que aos soluços – quente por dentro. As palavras contavam sobre meus filhos, sobre a casa, os joelhinhos ralados, as roupinhas coloridas, as espadas, as bolas e os brinquedos. Falavam de saudade, de memórias. Ler o texto em voz alta foi como chorar no quarto escuro, engolindo a respiração – só que desta vez rodeada da quentura das pessoas. Naquela hora eu era a menina de doze anos a ler a minha vida com orgulho e bravura – curada de mim mesma.
Eis um trecho do texto:
Que coisa é essa que é a saudade? Começa com uma lembrança inofensiva, vai crescendo quente dentro da gente, tomando o lugar do nosso sangue, fluindo lenta e permanente. Com a nossa ingênua permissão, vai invadindo pela porta incapaz de se fechar e, quando nos damos conta, já estamos doentes dela. Como fotos num infinito diário, ela desafia a memória – sempre perfeita e intacta nesses casos: aquela festinha na escola, os fios de cabelo cacheados, os joelhinhos sempre ralados no mesmo lugar, e ah! Aquela voz que não nos sai dos ouvidos! Até aqui, apenas a lembrança! Mas o coração não se contenta, quer mais… Não basta a lembrança que acalenta, prefere a saudade que corta. Mas a gente permite, quer mais! Afinal, como esquecer sem se emocionar: primeiro para fazer rir – num segundo que engana ser eterno; e depois, maldosa, para fazer chorar enquanto a gente durar”. (Narrativa da Memória, 2016).
Escrever e ler em voz alta é libertador. Pode nos levar ao infinito dentro da gente. Pode nos curar, salvar e nos mover.
Recomendo.
Experimente.
Ajudo pessoas a escreverem textos para as redes sociais e profissionais, focados em mostrar competências, objetivos de carreira e propósitos de vida.