Para usar uma expressão sutil, eu diria que ‘o mundo’ – e todos os que ainda permanecem nele – estão ‘falando em voz alta’. E pensando bem, seria até desnecessário explicar o porquê.
‘O mundo está falando em voz alta’ é uma metáfora – recurso comum utilizado por quem se vale da oralidade e da escrita para se comunicar (e olha, não são só os poetas que usam metáforas…). Por detrás dela, da metáfora, está a imagem associada à expressão. É quase que uma simples comparação, não fosse a potência da imagem que esta metáfora provoca em nós: ‘o mundo está falando em voz alta’… Ninguém pode deixar de imaginar um mundo cheio de bocas e vozes a falarem por aí, todas ao mesmo tempo…
Essa metáfora, ‘o mundo está falando em voz alta’, é também um eufemismo (outro recurso da comunicação) – uma maneira tênue (suave) de dizer que todos estamos pedindo socorro; e, a este ponto, eu diria que a melhor metáfora para este nosso contexto de pandemia não seria dizer que ‘o mundo está falando em voz alta’… Mas gritando. Ou chorando. Ou pedindo socorro. Em pânico.
A imagem de um ‘mundo falando em voz alta’ é suave demais para dizer que o Planeta está chorando, doente; e que a dor é iminente – inerente e permanente. Que a vida está em risco.
Mas ainda assim, ‘falar em voz alta’ é o que nos resta, o que nos cabe agora. cada um do seu lugar. Isto tudo também me faz pensar que, quanto antes aprendermos ‘a falar em voz alta’, menos será preciso ‘gritar’; pois que mais rapidamente o mundo e as pessoas que nele moram poderão se fazer ouvir, desde que…
As pessoas:
- Fiquem atentas à potência das palavras; por exemplo: ‘falar’ é sim diferente de ‘gritar’. Saber disto é confere a nós o livre arbítrio de escolher entre um e outro.
- Entendam que a escrita e a oralidade são ferramentas de luta individuais e coletivas, e devem ser usadas com parcimônia, consciência, responsabilidade e generosidade. Em resumo: você pensou em mim quando disse ou escreveu algo? Não desconsiderou o meu contexto, o meu momento, a minha dor?
- Percebam que a sintonia é condição primeira para a verdadeira comunicação humana. Implica em uma atitude complexa, pois que é preciso separar as minhas crenças pessoais daquilo que é fato. E isto significa dizer que é possível refletir sobre o argumento presente na fala da outra pessoa, sem concordar com ela ou validá-lo completamente. Até porque, para que esta validação aconteça, é preciso que se passe o argumento em questão pelo triplo filtro de Sócrates1, o filósofo: é útil? É bom? É verdadeiro?
- Entendam que compreender, interpretar e argumentar não são coisas que se aprendem apenas nas escolas com seus currículos. Estes são tópicos que devem ser treinados à exaustão a partir da infância (dentro e fora da escola): sempre é tempo de aprimorar nossa capacidade argumentativa.
- Saibam que os argumentos são fundados em princípios e estruturas, e eles podem nos salvar e até nos enganar.
Ora, se hoje ‘o mundo’ – e todos os que ainda permanecem nele – estão ‘falando – ou gritando – em voz alta’ – bom mesmo é ser capaz de ouvir todos eles com os ouvidos de Sócrates.
REFERÊNCIA: